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Larissa Santana

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Fundadora da escola de comunicação CALOR e pesquisadora do Grupo de Estudos em Comunicação e Criatividade nas Organizações da FGV.
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Inteligência artificial dá lição sobre confiança e liderança nas empresas

Num experimento, uma IA conseguiu convencer mais pessoas e criar mais conexão do que indivíduos. Sinal de que estamos falhando no que temos de mais humano.

Por Larissa Santana, colunista de VOCÊ RH
Atualizado em 30 out 2024, 15h16 - Publicado em 30 out 2024, 14h51
Ilustração de pessoas estudando o cérebro da inteligência artificial.
 (Malte Mueller/Getty Images)
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“Como criar uma conexão com meus colegas de trabalho?” – ouvi essa pergunta de uma aluna há algum tempo. Renata (nome fictício) disse que não se sentia “lembrada”. Que era procurada só quando alguém precisava de uma tarefa, e nunca para fofocar, ouvir um desabafo, dar pitaco no trabalho alheio.

Estávamos em uma aula online, e Renata me contou tudo isso de câmera fechada. Disse que trabalhava no modelo remoto e sempre entrava em reuniões sem ligar a câmera. “Todo mundo faz isso na empresa”, contou.

Bom, eu e você já notamos um problema aqui, certo?

Todos nós temos papéis e responsabilidades no trabalho. Ganhamos uma identidade “funcional”, com sobrenome composto. Gustavo “Gerente de Marketing”. Joana “coordenadora de contas a pagar”. Mas sabemos que nossa fração funcional é, justamente, uma fração. Somos integralmente humanos, com interesses, ambições, inseguranças, sonhos, desgastes, expectativas.

Ainda assim, não é raro valorizarmos alguém por suprimir do dia a dia da empresa tudo que não é “operacional”. “Fulano é uma máquina!”. Ou seja, eficiência = ignorar sentimentos e preocupações.

Engraçado ainda é acreditarmos nisso bem quando as máquinas estão aprendendo exatamente o contrário. A IA generativa está aprimorando sua capacidade de se expressar de forma mais engajadora – ao reconhecer e responder, veja só, a nossas características mais humanas, como sentimentos e preocupações.

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Uma dinâmica que já apliquei com 259 participantes, em empresas e faculdades, mostra isso na prática. Digo a humanos e ChatGPT que escrevam uma proposta para outras pessoas. Eles partem de uma mesma missão que determino – por exemplo, convidar alguém a “pagar sua mensalidade na faculdade” ou “abraçar um novo projeto que não está nas metas da pessoa nem vai gerar remuneração extra”. E cada um – dentre humanos e ChatGPT – escreve um texto com seus próprios argumentos, direcionados ao leitor. Os leitores recebem dois textos, um escrito por humanos e outro escrito pelo ChatGPT, e respondem a uma avaliação que pergunta: 1. o quanto ficaram dispostos a dizer “sim” à proposta, 2. o quanto sentiram de conexão pessoal com o texto e 3. o quanto sentiram de credibilidade/ relevância dentro do contexto em que estão. Importante: os leitores não sabem a autoria de cada texto nem que um deles foi escrito por IA.

Resultados somados, o ChatGPT está à frente nas três questões. Significa que uma máquina conseguiu convencer mais pessoas, criar mais conexão, parecer mais relevante no ambiente dos leitores do que um humano. E isso dentro de empresas e faculdades, que criam sua própria cultura por meio de princípios, valores, linguagem, rituais – todos desconhecidos do ChatGPT, que recebeu apenas um perfil simples dos participantes e uma descrição curta da empresa ou faculdade.

IA sentimental e imaginativa

Por que o ChatGPT se saiu melhor? Há muitas respostas possíveis, e precisaríamos de um estudo focado para buscar os motivos. Mas quero destacar aqui como a IA já aprendeu o valor de frases como:

“Eu entendo que essa proposta pode parecer estranha para você”

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“Conte comigo para retribuir sua ajuda no futuro”

“Sei que sua agenda já está cheia”

“Podemos criar algo que não só vai se destacar, mas que pode trazer resultados incríveis de longo prazo”

“Realmente acredito que sua experiência e visão poderiam transformar essa ideia em algo extraordinário”

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Repare: em todas as frases o ChatGPT está mostrando que “entende” desafios e sonhos do leitor. Validando sentimentos que poderiam se tornar objeções e ativando a imaginação para um universo de oportunidades. Construindo confiança.

O valor da confiança nas organizações

No trabalho, quando pessoas se conectam, elas passam a se importar umas com as outras. Como não querem desapontar seus colegas, acabam performando melhor. É o que mostram pesquisas do professor norte-americano Paul Zak, que concentrou muitos de seus estudos na análise de confiança dentro de organizações, e extraiu insights valiosos para líderes.

De acordo com os resultados obtidos por Zak, colaboradores de organizações com alto grau de confiança possuem (em comparação às organizações que apresentam menor grau de confiança):

  • energia para o trabalho 106% superior
  • produtividade 50% maior
  • alinhamento com o propósito da companhia 70% maior
  • número de ausências por licença médica 13% menor
  • incidência de burnout 40% menor
  • interesse em ficar na empresa pelo próximo ano 50% maior
  • senso de realização 41% maior
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No nosso dia a dia, temos muito mais oportunidades de construir relacionamentos e confiança do que o ChatGPT ou os participantes humanos da minha dinâmica. Enquanto eles usaram apenas texto, nós transmitimos informação por palavras, voz, corpo e rosto, o tempo todo. Se negligenciamos a importância dessa riqueza de sinais, como faz a Renata ao fechar a câmera nas reuniões, podemos causar uma impressão indesejada. De que não estamos interessados no outro, não estamos abertos, não queremos conversa além do estritamente essencial, por exemplo.

As máquinas já aprenderam que quanto mais sinais transmitirmos para gerar confiança, melhor. Estamos vendo uma profusão de empresas lançando ferramentas novas de IA para narrações em áudio e avatares de vídeo. E não à toa elas reforçam a potenciais clientes que seus produtos são “expressivos”. O objetivo das empresas é não apenas passar informações por meio dos bots, mas construir uma conexão com quem está vendo ou ouvindo. E assim desenvolvedores seguem trabalhando duro para fazer cada sorriso robótico parecer mais humano.

Pois, se as máquinas querem ser humanas, por que queremos ser máquinas no trabalho? Gostaria que nós também nos lembrássemos da força que nossas características humanas têm, as mesmas que agora a IA busca replicar. Em vez de virarmos “máquinas de produtividade”, podemos nos tornar ainda mais humanos – mais empáticos, mais conectados, mais abertos. É assim que construiremos vínculos duradouros, confiança e, de quebra, maiores níveis de eficiência.

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