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A importância da média gerência

Entre a alta liderança e a linha de frente, gestores não têm sido incluídos nas decisões. Saiba por que eles são essenciais para as mudanças nas empresas.

Por Michele Loureiro
Atualizado em 11 jun 2024, 09h40 - Publicado em 7 jun 2024, 06h28
Um guindaste levantando pessoas no topo de um prédio.
 (Ilustração: Gustavo Magalhães/VOCÊ RH)
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No final da década de 1970, Abraham Zaleznik, importante estudioso e professor de Harvard no campo da dinâmica organizacional e da liderança nas empresas, escreveu um artigo sobre a diferença entre gestores e líderes. Segundo ele, aos gestores caberia apaziguar conflitos e assegurar o cumprimento das atividades diárias. Já os líderes são aqueles que adotam atitudes pessoais em relação a seus objetivos, buscam oportunidades e estimulam o processo criativo nas empresas. Por décadas, o conceito de menor importância pesou sobre gestores de médio patamar – gerentes, supervisores e coordenadores. Mas muitas companhias já estão notando que esses profissionais são, sim, capazes de promover transformações mais profundas em uma organização. Afinal, será que chegou a hora de a média gerência brilhar?

Precisamos assumir que, ao menos por enquanto, ainda há muito caminho pela frente. De acordo com um estudo realizado pela Cia de Talentos, apenas 27% das pessoas que ocupam cargo de média gestão sentem que podem expressar sua identidade e opiniões sem receio dentro da empresa em que trabalham. Para ter uma ideia, esse índice é de 45% entre a alta liderança. Quando questionados sobre autonomia, apenas 23% afirmam que têm liberdade de ação, ante 45% dos líderes. Sobre comunicação aberta e honesta, 70% da média gestão afirma que não reconhece essa prática. Em contrapartida, só metade da alta liderança dá a mesma resposta. Ou seja, gestores de médio patamar e líderes têm visões distintas e diferenças expressivas no senso de pertencimento.

Em um artigo recente publicado na Harvard Business Review, Zahira Jaser, professora da Escola de Negócios da Universidade de Sussex, explica que “há uma tendência de educar os gerentes sobre como ‘evoluir’ e se tornar líderes”, como se essas pessoas não  desempenhassem também um papel de liderança, e tivessem uma função menos importante. Para a especialista, contudo, a média gestão é “o motor do negócio, as engrenagens que fazem as coisas funcionarem, a cola que mantém a empresa unida”. Ou pelo menos deveria ser assim.

Para o consultor Manoel Lins, com experiência de 25 anos em planejamento estratégico e sócio da Auddas, empresa especializada em média gerência, essa faixa de profissionais ainda é ignorada em grande parte das corporações. “Em mais de 80% das companhias com as quais lidamos no cotidiano, a média gerência não está envolvida nas discussões estratégicas. Ao analisar negócios com esse perfil, cada vez mais observamos que o afastamento entre a média gerência e a alta liderança dificulta o cumprimento de metas e a eficiência operacional”,  diz.

Nos últimos dois anos, Manoel entrevistou cerca de 1.500 gestores de 80 empresas e constatou que as principais dores são a falta de comunicação, de confiança e de feedbacks constantes. “Há um modelo mental que promove isso, um pensamento ultrapassado de que as estratégias devem ser pensadas de cima para baixo, sem levar em conta as dores e ideias de quem está na frente de ação. O modelo precisa evoluir para um formato mais horizontalizado, com foco na autonomia desses gestores”, diz. 

Ainda em sua pesquisa, o consultor questionou o principal motivo por trás de as empresas não atingirem suas estratégias: 55% dos entrevistados indicaram que o principal limitante é alinhar a comunicação interna com as áreas envolvidas e ter definições claras de quem pode tomar as decisões e tem autonomia para executar os projetos.

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Na maioria das empresas, as discussões que envolvem o planejamento estratégico costumam ficar restritas aos sócios e aos integrantes do conselho ou da alta diretoria. Um grande erro. O fato é que a média gerência é o elo que ajuda uma companhia a caminhar entre o ponto A e o ponto B. “É a partir desses profissionais que é possível obter um diagnóstico da corporação, e é junto com eles que se cria um plano de ação para chegar ao ponto B. Não tem lógica tirá-los do processo”, defende Manoel.

A empresa é o primeiro chefe que vemos

Além de ser fundamental na construção dos indicadores do planejamento estratégico, a média gestão tem um papel importante em representar a marca empregadora. Isso porque são esses gestores que recebem os profissionais das equipes e estão com eles no dia a dia das atividades. São, portanto, os modelos de referência dos comportamentos a serem seguidos – especialmente nas grandes companhias, em que o contato com a alta liderança costuma ser bastante restrito. “Por isso, eles atraem, ou repelem, talentos. São também os tradutores oficiais das mensagens do topo para a base e vice-versa. Então, como deixá-los de fora da estratégia?”, diz a consultora Carolina Marcon, autora do livro O Poder dos Times AAA: Como Times Executivos Geram Crescimento Sustentável Por Meio de Pessoas.

Para Bell Gama, sócia da Air, consultoria especializada em Marca Empregadora, a média gerência é “a vida de uma marca”. “Existem as pesquisas de clima, as newsletters, as reuniões gerais e as ações para clima e engajamento. Mas o ponto de contato mais importante é essa pessoa que está todo dia dando exemplo e falando sobre a marca, sobre a cultura da empresa e sobre as metas.”

É hora de começar a virar o jogo

Na lista de negócios que já perceberam a relevância do tema está o Grupo Leonora, empresa catarinense que é a maior importadora e distribuidora de material escolar do Brasil. Depois da intervenção da consultoria Auddas, que realizou workshop e trabalho de diagnóstico com o conselho, diretores, CEO, gerentes e coordenadores seniores, a história começou a mudar.

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Edson Cardoso Teixeira, diretor-executivo da companhia, disse que houve uma virada de chave ao incluir ainda mais a média gerência na estratégia. “Isso enriqueceu o plano com insights valiosos, além de fortalecer o comprometimento de todos, facilitando uma implementação mais suave e realista, com maior probabilidade de sucesso”, explica. A expectativa é que o novo modelo colabore para a companhia atingir a meta de alta de 25% no faturamento em 2024 e ficar na casa dos R$ 500 milhões.

Tulio Santiago da Rocha, gerente de E-commerce da Leonora, foi um dos impactados com o movimento de transformação na empresa. Com sete pessoas na equipe, ele afirma que houve aumento do senso de pertencimento e da confiança. “Ano passado, eu e meu time tivemos a iniciativa de prospectar uma nova modalidade de comércio com concessão de crédito para clientes que compravam à vista, e houve vendas incrementais de R$ 1 milhão. Esse trabalho foi tão bem aceito que a modalidade virou recorrente. Acredito que fazer parte da estratégia vai além de executar, mas ter espaço e autonomia para colaborar”, diz.

Duas mulheres conversando. Há um homem dirigindo um guindaste ao fundo.
Os principais problemas das companhias que não incluem gerentes, supervisores e coordenadores nas decisões são a falta de comunicação, de confiança e feedbacks constantes. (Ilustração: Gustavo Magalhães/VOCÊ RH)

Inovação na linha de frente

Entre os benefícios – e urgências de incluir a média gerência na estratégia – está a questão da inovação. Manoel Lins aponta um dado alarmante: 80% das corporações que a consultoria atende, todas com faturamento acima de R$ 100 milhões, não sabem o que é uma estruturação de inovação, e simplesmente não pensam nessa questão. “Os gerentes de nível médio têm um papel primordial quanto a modificar a rotina atual, o que geralmente resulta em inovações. É por isso que conceber a gerência intermediária apenas em termos operacionais significa negligenciar o potencial estratégico desses interlocutores.”

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Para Luiz Afonso Wan-Dall Júnior, CEO da Colormaq, fabricante de eletrodomésticos, incluir as médias lideranças no plano estratégico é uma das apostas para inovar e ampliar os resultados da companhia. Ele conta que os planejamentos anuais da empresa sempre eram realizados nos modelos tradicionais, no formato top-down, mas que a mudança de mindset tem provocado transformações. “A verdade é que o planejamento era comunicado na base do telefone sem fio. Ao incluir os gestores na reflexão, isso muda de escopo e conseguimos desdobramentos conectados com o objetivo. Além disso, notamos um ambiente mais favorável à inovação”, diz.

Tanto é assim que Victoria Brito Campos, coordenadora de Controladoria da empresa, diz que a inclusão nas decisões a fez sentir-se mais considerada. “Também noto que as metas estão mais coerentes, e fica mais fácil cascatear para minha equipe”, diz.

Além de se apoiar em inovação e desbravar novas possibilidades, o crescimento sustentável de uma empresa, no médio e longo prazo, depende de alguns fatores. Essa lista inclui: planejamento assertivo, previsão adequada de custo operacional, baixo impacto na operação, eficiência operacional e um plano de expansão exequível. A média gerência é um denominador comum em todos eles. Então pode ser a hora de convidar seus gerentes para um café com uma pitada de planejamento estratégico, não é mesmo?

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Este texto faz parte da edição 92 (junho/julho) da Você RH. Clique aqui e confira os outros conteúdos da revista impressa.

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