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Entrevista: VP de Gente e Gestão da Americanas fala sobre a reconstrução da empresa

Leonardo Ferreira assumiu o RH após o escândalo das fraudes contábeis do ano passado. Sua tarefa é colocar o colaborador no centro, investindo em transparência absoluta e na saúde mental da equipe – além de evitar a fuga de talentos.

Por Alexandre Carvalho
Atualizado em 15 fev 2024, 14h33 - Publicado em 29 jan 2024, 12h54
Entrevista Leonardo Ferreira
 (Celso Doni/Reprodução)
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A comunicação interna da Americanas tem o que a empresa chama de jornal eletrônico, divulgado entre os funcionários toda sexta-feira. A peculiaridade dessa newsletter é trazer só notícias boas. E tem um porquê para essa escolha “poliana” de pautas. O recurso é um contraponto à avalanche de acontecimentos terríveis pelos quais a varejista – uma das mais tradicionais do Brasil – tem passado desde o início de 2023.

Foi em 11 de janeiro do ano passado que a companhia teve o maior baque de sua história. A Americanas divulgou ao mercado um rombo que chegaria ao valor de R$ 25,3 bilhões em dívidas que não apareciam nos balanços. Imediatamente, o então CEO, Sérgio Rial, e o diretor de relações com investidores, André Covre, renunciaram. Oito dias depois, a empresa entraria com um pedido de recuperação judicial, situação em que se encontra até hoje. 

A nova liderança da varejista tem como meta arrumar a casa e sair da crise em 2026. E acredita que a reconstrução, tanto financeira quanto de reputação, passa principalmente por seus recursos humanos. É o que mostra, nesta entrevista, Leonardo Ferreira, vice-presidente de Gente e Gestão da Americanas.

A meta da Americanas é sair da recuperação judicial em 2026. Como você vê esse prazo?

Esse objetivo de 2026 é mais voltado para o plano de RJ do que para a nossa reconstrução interna. Hoje, a percepção de crise na companhia não existe aqui dentro. Isso porque, dentro desse modelo que está sendo implementado na gestão do novo CEO, Leonardo Coelho, as pessoas estão no centro. São nosso foco principal.

Como foi o baque para os colaboradores, naquele primeiro momento, em que saíram as notícias de fraude?

Não tenho muito essa sensibilidade porque cheguei à companhia após essas notícias. Assim que vim, criamos um escritório de transformação. Eu e o Leonardo Coelho procuramos olhar para a frente, trazendo as pessoas para fazerem parte dessa mudança. Tenho a convicção de que uma empresa numa situação especial como a nossa só consegue sair disso por meio das equipes. Para fazer esse plano de reconstrução, mesmo que interno, você precisa ter um quadro de como estão essas pessoas. Houve uma pesquisa de clima que nos apontou até como estava a saúde mental dos funcionários. Foi nosso ponto de partida.

Diante de um ambiente de incerteza, com os principais nomes da companhia envolvidos num escândalo de fraude, os profissionais se sentem muito vulneráveis, correto?

É isso mesmo. E é o motivo de a gente trazer as pessoas para o centro das discussões. Precisamos fazer uma gestão muito transparente, com relatos semanais, uma comunicação interna robusta, com muita humanização do processo. Assim cada funcionário vira um porta-voz dessa transformação organizacional. 

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Até porque, na Americanas, as pessoas têm uma relação afetiva muito forte com a companhia. Se você fizer um mapa do nosso quadro funcional, vai ver que a grande maioria dos nossos colaboradores tem mais de dez anos de casa. Isso mostra o quanto a Americanas já proporcionou aos seus colaboradores: desde o primeiro emprego, passando pelo desenvolvimento profissional, as oportunidades e até o job rotation, que é uma característica aqui. Toda essa cultura de pertencimento nos ajudou a recuperar mais facilmente a autoestima dos funcionários.

Entrevista Leonardo Ferreira
Leonardo Ferreira, VP de Gente e Gestão da Americanas: “Quando a companhia passa por uma crise dessas, as pessoas se sentem parte do problema. Por outro lado, também se veem como parte da solução”. (Imagem: Celso Doni) (Celso Doni/Reprodução)

Você mencionou que a pesquisa de clima naquele primeiro momento de reconstrução passou por identificar como estava a saúde mental dos funcionários. Como está sendo esse cuidado?

Hoje nós temos um núcleo ligado ao RH, diretamente a mim, com uma gerente psicóloga, outros psicólogos e assistentes sociais com a função de trabalhar a resiliência dos funcionários e os distúrbios mentais relacionados ao estresse.

Esse trabalho é pautado em metodologias que proporcionam a esse colaborador recuperar sua saúde mental e, principalmente, sua autoestima. Como eu disse, há um sentimento muito enraizado de pertencimento aqui. Então, quando a companhia passa por uma crise dessas, as pessoas se sentem parte do problema. Por outro lado, também se veem como parte da solução, o que facilita a virada de jogo.

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O que essa situação implicou de mudança na cultura organizacional?

Não quero minimizar as experiências que tive anteriormente, mas tem sido um grande desafio. Tudo na Americanas é grande. A gente está falando de mais de 1.600 lojas em todos os estados brasileiros, 14 centros de distribuição… Para você ter uma ideia, nós temos 17.800 funcionários só na operação das lojas. Então tudo o que você faz na companhia reverbera muito. 

O primeiro movimento foi humanizar a figura do nosso CEO. O Leonardo Coelho não é uma entidade. É um profissional capacitado, de carne e osso, que comete acertos e erros. E que não pode ser a personalização da virada. Nosso mantra aqui é que a reconstrução tem de passar por todos. Então criamos vários canais de integração com o CEO.

O Leonardo grava muitos vídeos, inclusive dando notícias de primeira mão ao grupo antes que sejam publicadas. Também temos um jornal eletrônico que, toda sexta-feira, dispara apenas pautas com boas notícias. Estamos sendo transparentes com as notícias ruins, mas criamos esse recurso para que as equipes estejam conscientes de cada vitória que conseguimos com o esforço de todos.

Como vocês estão lidando com a retenção de talentos num momento como esse?

De diversas maneiras. Uma delas é criar oportunidades internamente. O varejo costuma ser o primeiro emprego de muita gente, aí a pessoa se desenvolve na empresa e, muitas vezes, vai embora após essa formação. Nós estamos fazendo um mapeamento de oportunidades para que o profissional cresça aqui depois desse desenvolvimento.

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Alguém que se formou em engenharia, por exemplo, pode se tornar um engenheiro do trabalho numa operação do centro de distribuição. Outro profissional pode integrar um grupo de expansão das lojas. Melhoramos também o plano de cargos e salários, inclusive trouxemos o que nossos concorrentes estão praticando para que pudéssemos estar adequados a esse momento.

E criamos uma trilha de carreira, porque, nesse momento em que a retenção de talentos é um desafio, o profissional precisa perceber qual a sua jornada possível aqui. Trouxemos carreiras em Y (saiba mais sobre o assunto nesta reportagem), em W, e estamos trabalhando um modelo de remuneração variável. Enfim, dentro desse cenário de incertezas, oferecemos oportunidades diferenciadas, trabalhando em questões filosóficas e de cuidado mental. Tudo para que nossos profissionais se sintam motivados e, sobretudo, blindados – até que tudo se resolva.

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Este texto faz parte da edição 90 (fevereiro/março) da VOCÊ RH. Clique aqui para conferir os outros conteúdos da revista impressa.

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