Quem visita a sede do PayPal na Avenida Paulista, em São Paulo, encontra muita gente falando espanhol pelos corredores. Isso porque, em 2018, a operação da multinacional de serviços de pagamento online centralizou no Brasil o atendimento aos clientes de 21 países de língua espanhola.
Até então, esse serviço era feito pela subsidiária da Costa Rica. Com o crescimento global da companhia e a necessidade de expandir a central de relacionamento, a empresa decidiu buscar um novo país para compartilhar o atendimento dos consumidores de língua espanhola. E o escolhido foi o Brasil.
Além de a unidade brasileira ocupar as primeiras posições em indicadores globais do PayPal, como o Net Promoter Score (NPS), nota dada pelo cliente depois de passar pelo canal de atendimento, a matriz considerou outra questão: o fluxo migratório de venezuelanos.
De acordo com os últimos dados da Agência da ONU para Refugiados (Acnur), há 224 000 refugiados da Venezuela em todo o país. “Ao longo de muitos anos, tivemos resistência em testar o espanhol por aqui, porque acreditávamos que haveria dificuldade para selecionar falantes. Com a vinda dos refugiados, percebemos que seria interessante fazer um teste”, diz Ana Paula Kagueyama, diretora sênior de operações do PayPal para a América Latina.
A SOLUÇÃO
Em dezembro de 2018, o PayPal iniciou um projeto-piloto chamado Voltando a Sonhar. Com o apoio da Sitel, empresa que oferece serviços de atendimento ao cliente, e de ONGs que ajudam na recolocação profissional de estrangeiros, dez refugiados — oito deles venezuelanos — foram contratados para ocupar cargos de analista de atendimento ao cliente. “Associamos a ótima qualidade desses profissionais com uma ação extremamente inclusiva. São pessoas com excelente formação. Temos advogados e profissionais com experiência em TI na equipe”, afirma Ana Paula.
Com o sucesso da empreitada, a empresa decidiu intensificar as contratações. Hoje, dos 100 refugiados contratados, 70% são venezuelanos. O restante está dividido entre peruanos, chilenos e bolivianos.
Para integrá-los à organização, há um treinamento de seis semanas sobre os processos e o funcionamento da empresa e ações para facilitar a vida deles no país. Além de criar um programa de bem-estar financeiro, com treinamentos em educação financeira, a companhia passou a auxiliar os refugiados em trâmites como abertura de conta em banco e realização de contrato de aluguel. “Eles chegam com muitas dificuldades para resolver questões do dia a dia”, pontua a executiva.
O PayPal também agregou aos eventos da empresa celebrações de datas comemoradas pelos latinos, como o Día de los Muertos (Dia dos Mortos) e o Día de los Reyes (Dia de Reis). Outra iniciativa foi disponibilizar um espaço com lanches gratuitos em tempo integral para os funcionários. “A renda dos venezuelanos é totalmente compartilhada, porque eles precisam ajudar os familiares que ficaram lá. Muitas vezes, eles chegam sem ter feito nenhuma refeição para trabalhar”, explica Ana Paula.
O RESULTADO
Do início do projeto-piloto para cá, a empresa já colhe frutos. O turnover entre os refugiados é baixo: de 17% ao ano, enquanto no mercado de atendimento ao cliente o índice chega a 70%. Além disso, 10% dos contratados já foram promovidos a cargos como os de supervisores e coordenadores.
Hoje, a central que atende clientes de língua espanhola, comandada pela operação brasileira, já figura entre as três melhores do PayPal no mundo. Outro ponto positivo é o intercâmbio cultural. Ana Paula conta que a convivência com os colegas de fora levou os brasileiros a se interessarem pelo espanhol. Atualmente, 20% do time faz curso do idioma.
Para fomentar a prática, o PayPal oferece subsídio de 5 000 reais por ano para funcionários e terceiros estudarem espanhol. “A chegada dos refugiados trouxe um enorme ganho cultural.” A expectativa é que, em 2020, o número de empregados estrangeiros salte de 100 para 125.